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Transexualidade– Ciência e Espiritismo Evoluindo Junto com as Leis Naturais da Divindade


Isabelle Oliveira


Morre em Recife, Roberta da Silva, mulher trans vítima de transfeminicídio, que teve 40% do corpo queimado na Estação de Ônibus Cais de Santa Rita por um adolescente, o qual foi preso em flagrante e encaminhado para FUNASE, onde cumpre detenção provisória e aguarda sentença. Ela estava internada no HR (Hospital da Restauração) desde 24 de junho, e faleceu às 9h em 9 de julho de 2021. Roberta teve, antes de morrer, o braço esquerdo completamente amputado e parte do direito, pois os ferimentos foram gravíssimos (O GLOBO, 2021, on-line).


Roberta Silva, mulher trans, 32 anos. Morreu apenas por ser quem é.


Essa história foi notícia em vários meios de comunicação no país, gerando revolta e indignação, principalmente na comunidade LGBTQIAP+. Como Roberta, existem tantas outras. No Brasil, foram assassinadas cerca de 80 mulheres trans no primeiro semestre de 2021. A transfobia existe e mata (OLIVEIRA, 2021, on-line).


George Jorgensen, americano, 28 anos e herói do exército americano, submeteu-se a vários tratamentos hormonais e logo em seguida, à cirurgia de mudança de sexo (transgenitalização), feita pelo médico Christian Hamburger, na Dinamarca, em 1952. Então, George passa a ser oficialmente Christine, se tornando a Mulher do Ano em 1954 (LOPES, s.d., p. 02).


Esse foi o primeiro caso de transgênero noticiado e que ganhou grande repercussão mundial, o que não significa que a vida de Christine foi fácil, pois sua transexualidade foi tratada como patologia, mesmo com a conquista da mudança de sexo, até porque a cirurgia era considerada uma forma de tratamento para tal doença (LOPES, s.d., p. 02).


Nesse meio tempo, em 1953, o endocrinologista Harry Benjamin nomeia o termo transexualismo para se referir a transexualidade, elegendo-a como patologia, visto que o sufixo -ismo, para a medicina, é designado para nomear doenças (PERELSON, 2011, on-line). Ou seja, desde o início a transexualidade é tratada como patologia e considerada uma anormalidade.


Apenas em 2018 a OMS (Organização Mundial de Saúde), na 72ª Assembleia Mundial da Saúde, sediada em Genebra, retira a transexualidade da Classificação de Transtorno Mental da 11ª Versão da CID (Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas de Saúde). Contudo, a OMS só oficializou em maio de 2019. A partir daí a transexualidade entra na categoria de Condições Relacionadas à Saúde Sexual e é classificada como Incongruência de Gênero (GCPM/CFP, 2019, on-line).


Observa-se que é uma conquista muito recente para a comunidade transgênero, porém muito significativa, pois representa o respeito e a garantia de dignidade a essas pessoas que historicamente sofrem preconceito e discriminação. Além disso, desse modo, há como caracterizar violação de direitos humanos à patologização da transexualidade.


É fato que a ciência e a sociedade estão evoluindo, mesmo a passos lentos, entendendo que a transexualidade não é normal nem anormal, mas sim natural.


MAS O QUE É TRANSGÊNERO?

Para entender o que é uma pessoa transgênero, se faz necessário saber diferenciar identidade de gênero e orientação sexual.


Identidade de gênero é como a pessoa se reconhece, como se sente. Podendo ser homem, mulher, os dois ou nenhum (SIGNIFICADOS, s.d. on-line). Existem três principais:

- Transgênero: Quando o sujeito se identifica com o gênero oposto ao que nasceu biologicamente. Uma pessoa nasce com o corpo do gênero masculino, mas se sente do gênero feminino e vice-versa (PIMENTA, 2020, on-line);

- Cisgênero: Quando o sujeito se sente exatamente como o gênero que nasceu. Nasce num corpo de mulher e sente como mulher, e vice-versa (PIMENTA, 2020, on-line);

- Não binário: Uma mistura que transita entre os dois gêneros ou não se reconhece em nenhum deles. Possui subdivisões, algumas delas são: agênero (ausência de gênero), andrógino (mistura dos dois gêneros), gênero fluido (mudança frequente de gênero), mulher ou homem não-binário (por algum motivo se aproxima mais de algum gênero, seja por comportamento ou vestuário e etc.) neutrois (gênero neutro), demigênero (identificação parcial com um dos gêneros) - (SIGNIFICADOS, s.d. on-line);


Orientação sexual é para onde se orienta o desejo sexual, por qual gênero o indivíduo sente atração sexual e/ou afetiva. São eles:

- Heterossexual: Atração pelo sexo oposto;

- Homossexual: Atração pelo mesmo sexo;

- Bissexual: Atração pelos dois sexos;

- Assexual: Atração por nenhum dos sexos, mas consegue se envolver afetivamente. Dentro da assexualidade ainda há algumas subdivisões, que são: aversão ao sexo, favorável ao sexo, repulsa ao sexo, indiferente ao sexo, cupiossexual (não consegue ter atração sexual, mas deseja ter um comportamento sexual e relacionamento afetivo), assexuado libidoísta (é assexuado, porém podem gostar de experimentar sensações como a masturbação e a autoestimulação sexual), graysexual (sente atração sexual raramente ou com tem um desejo sexual muito leve), grayromantic (os que experimentam esporadicamente ou com baixa intensidade a atração romântica) – (LOBO; MOURA, 2022, on-line);

- Sapiosexual: Se sente atraída pela inteligência (LOBO; MOURA, 2022, on-line);

- Demissexual: São aqueles que sentem atração sexual com pessoas que já estabeleceram um vínculo afetivo (LOBO; MOURA, 2022, on-line);

- Pansexual: Atração por todos os gêneros e sexos, despertando desejo pela pessoa, independente do sexo ou da identidade de gênero (LOBO; MOURA, 2022, on-line).


Portanto, uma pessoa transgênero pode ter quaisquer dessas orientações sexuais.

O QUE O ESPIRITISMO NOS TRAZ SOBRE A TRANSEXUALIDADE?

Muito pouco, pois ainda não há muitos escritos sobre o tema, mas podemos citar dois livros mais famosos, porém antigos, e um livro mais atual. O primeiro livro seria Forças Sexuais da Alma, de Jorge Andrea, tendo sua primeira edição lançada em 1987, o qual fala sobre a transexualidade no capítulo IV, ainda utilizando o termo transexualismo e tratando-a como patologia (ANDREA, 1996, capítulo IV).


O segundo é Dias Gloriosos, psicografia de Divaldo Franco pelo Espírito Joanna de Ângelis, o qual dedica o capítulo 14 para falar sobre mudança de sexo. Joanna explica que o perispírito, na qualidade de modelo organizador biológico, trabalha diretamente na formação do ser orgânico de acordo com suas necessidades nessa nova encarnação, atuando geneticamente enquanto o espírito atua psíquica e emocionalmente. Desse modo, traz para nova existência suas experiências anteriores e deposita as ferramentas necessárias para própria evolução, trabalhando para que haja o equilíbrio físico, psicológico e intelectual, de forma que não aconteça eventos para possíveis traumas nesse processo. Além disso, há uma forte conexão entre os genitores e o Espírito reencarnante, os quais exercem uma forte influência psíquica na formação desse Espírito, sobretudo da mãe para com o bebê, visto que a relação é bastante forte. Muitas vezes, o pai ou a mãe tem o intenso desejo por determinado gênero (feminino ou masculino), que pode diferenciar do sexo destinado aquela criança, isso é retido pelo Espírito durante sua formação embrionária e pode interferir na polaridade sexual desse novo ser, fazendo com que ele se sinta numa polaridade sexual diferente da que foi designado (tanto para orientação sexual quanto para identidade de gênero). Por isso convém que os pais apenas acolham com todo amor, sem preferência desse ou daquele gênero, deixando que fique a cargo do Espírito e que a vida siga com naturalidade. Joanna conclui o capítulo falando da importância de se guiar pelo amor para assim seguir orientando-se na prática do bem com a finalidade de cumprir a meta estabelecida para tal reencarnação, que o novo ser seja amado e siga amando. Salientando que esta obra teve sua primeira edição publicada em 1999 (FRANCO, 1999, capítulo 14).


Precisa ser levado em consideração a época de publicação desses livros, haja vista que não havia as informações, pesquisas e a evolução científica e social que existe na atualidade. Esses escritos foram feitos à luz de seu tempo, com as informações que lhes eram acessíveis nos dois planos, tanto Espiritual quanto físico. Contudo, o mundo evoluiu junto com a ciência, novas descobertas foram feitas no campo da medicina, psicologia, socioantropologia e tantas outras ciências que ajudaram a Terra a dar um passo à frente no que se diz respeito a comunidade transgênero, inclusive dentro do Espiritismo e Movimento Espírita.


E com essa evolução, o médico Andrei Moreira pôde se munir de novas informações e pesquisas para atualizar os escritos Espíritas, lançando em 2019 o seu livro Transexualidade Sob a Ótica do Espírito Imortal. Trazendo este debate ao meio Espírita de forma esclarecedora, com conceitos atualizados e despatologizando a transexualidade (FREITAS, MOREIRA, 2017, on-line), levando o Espiritismo a avançar junto com a ciência, como sempre pregou o codificador Allan Kardec.


O QUE A CODIFICAÇÃO DE KARDEC NOS TRAZ SOBRE TRANSEXUALIADE?

Nada específico, visto que O Livro dos Espíritos (O.L.E) teve sua primeira edição publicada em 1857, mais de cem anos antes da transexualidade se apresentar para o mundo. Todavia, o codificador nos deixou caminhos para entender melhor a transexualidade por uma ótica Espiritista. Em O.L.E., existem pontos relevantes para se compreender melhor a transexualidade. São eles:

- Deus é inteligência suprema e não comete erros em suas criações, fez os Espíritos simples e ignorantes para progredir através da reencarnação. Sendo Deus bom e justo, criou as leis naturais que regem o Universo, para Ele todos são iguais perante Suas leis (KARDEC, 2022, p. 17-57);

- Na pergunta 136 b, explica que o corpo sem alma é simples massa sem inteligência, que pode ser qualquer coisa menos um homem (KARDEC, 2022, p. 90);

- Como bem traz as perguntas 200 a 202 de O.L.E., os Espíritos não têm sexo, podem reencarnar no corpo de homem ou de mulher, de acordo com a prova que precise passar (KARDEC, 2022, p. 112-113);

- Nas perguntas 216 e 217, os Espíritos e o codificador nos falam das possibilidades das parecenças físicas e morais que o Espírito imprime em seu novo corpo. Moralmente, ele traz consigo os avanços das existências pregressas e, fisicamente ele não pode dar à matéria a mesma aparência do corpo anterior, mas o Espírito se reflete no corpo, imprimindo nele as qualidades do Espírito, que frequentemente lhe modificam os órgãos, dando ao corpo características próprias da personalidade do Espírito (KARDEC, 2022, p. 116);

- As perguntas 334 e 335 falam sobre a escolha do corpo que o Espírito irá reencarnar. O Espírito pede para reencarnar, mas nem sempre tem direito de escolher o corpo, podendo apenas escolher o gênero, no entanto Deus sempre sabe e vê qual corpo está designado para tal Espírito (KARDEC, 2022, p. 158);

- O Espírito pode até se queixar da vida que tem, mas não pode reclamar da escolha que fez, visto que não se pode reclamar de uma escolha que não se recorda, pois, ao reencarnar, esquece de todo esse planejamento reencarnatório. Além disso, ele não retoma toda as suas faculdades ao nascer, elas se desenvolvem gradativamente com os órgãos. O Espírito se encontra em uma nova existência e precisa se adaptar com a nova realidade, a consciência retorna aos poucos e ele se vê em uma situação diferente da que vivia anteriormente. É o que nos traz as perguntas 350 e 352 de O.L.E. (KARDEC, 2022, p. 160-161);

- Pergunta 367 de O.L.E.

“Unindo-se ao corpo, o Espírito se identifica com a matéria?

Resposta: A matéria é apenas o envoltório do Espírito, como o vestuário o é do corpo. Unindo-se a este, o Espírito conserva os atributos da natureza espiritual.” (KARDEC, 2022, p. 164);

- A influência dos órgãos não interfere no desenvolvimento do cérebro, nas faculdades morais e intelectuais, visto que não são os órgãos que dão as faculdades ao Espírito, mas sim o inverso. É o que nos traz a questão de número 370 de O.L.E (KARDEC, 2022, p. 165).


Isto posto, constata-se que Deus não comete erros em suas criações, que os Espíritos não possuem sexo definido, podendo reencarnar em ambos os gêneros, que eles imprimem suas faculdades nos órgãos do novo corpo e trazem consigo as características das existências anteriores, que precisam também se adaptar ao novo corpo, podendo ter dificuldades nesse processo. Levando em consideração que nem sempre eles têm a oportunidade de escolher o corpo, sendo possível apenas escolher, ou não, o gênero. Tudo isso traz um novo olhar para a identidade de gênero, consequentemente aos transgêneros, que são seres criados por Deus dentro das leis naturais que regem o Universo, sendo assim, obras naturais e divinas.


REFERÊNCIAS


ANDREA, Jorge. Forças Sexuais da Alma. Capítulo IV. 7.ed. Rio de Janeiro/RJ: FEB, 1996.


BLOG LETRA ESPÍRITA. O Espiritismo e a Transexualidade. Disponível em: https://www.letraespirita.blog.br/single-post/o-espiritismo-e-a-transexualidade. Acesso em: 04/04/2023.


FRANCO, Divaldo. Dias Gloriosos, pelo Espírito Joanna de Ângelis. Capítulo 14. 3.ed. Salvador, BA: Livr. Espírita Alvorada,1999.


FREITAS, Dionne; MOREIRA, Andrei. Transexualidades sob a ótica do Espírito imortal. 2017. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=lrZmGZaDmLo. Acesso em: 04/04/2023.


GCOM/CFP. Transexualidade não é transtorno mental, oficializa OMS. 2019. Disponível em:https://site.cfp.org.br/transexualidade-nao-e-transtorno-mental-oficializa-oms/


KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos, tradução de Guillon Ribeiro. Campos dos Goytacazes/RJ: Editora Letra Espírita, 2022.


LOBO, Pedro; MOURA, Bárbara. Demissexual, sapiossexual e mais: quais são os tipos de sexualidade? 2022. Disponível em: https://gq.globo.com/sexo/noticia/2022/12/demissexual-sapiossexual-tipos-sexualidade.ghtml. Acesso em: 04/04/2023.


LOPES, André Cõrtes Vieira. Transexualidade: Reflexos da redesignação sexual. Disponível em: https://ibdfam.org.br/assets/upload/anais/229.pdf. Acesso em: 04/04/2023.


MURTA, Daniela. Sala de Entrevista: Transexuais e contexto histórico – Psicologia. 2011. Disponível em: https://www.canalsaude.fiocruz.br/canal/videoAberto/transexuais-e-contexto-historico-psicologia-SCE-0013. Acesso em: 04/04/2023.


O GLOBO. Morre mulher trans que teve 40% do corpo queimado por adolescente no Centro de Recife. Disponível em: https://oglobo.globo.com/brasil/morre-mulher-trans-que-teve-40-do-corpo-queimado-por-adolescente-no-centro-do-recife-25100028. Acesso em: 04/04/2023.


OLIVEIRA, Luciana de. 80 pessoas transexuais foram mortas no Brasil no 1º semestre deste ano, aponta associação. Disponível em: https://g1.globo.com/politica/noticia/2021/07/07/80-pessoas-transexuais-foram-mortas-no-brasil-no-1o-semestre-deste-ano-aponta-associacao.ghtml. Acesso e,: 04/04/2023.


PERELSON, Simone. Transexualismo: Uma questão do nosso tempo e para o nosso tempo. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2178-700X2011000200004#nt01. Acesso em: 04/04/2023.


PIMENTA, Tatiana. Identidade de gênero: Tudo o que você precisa saber. 2020. Disponível em: https://www.vittude.com/blog/identidade-de-genero/. Acesso em: 04/04/2023.


SIGNIFICADOS. Identidade de gênero. Disponível em: https://www.significados.com.br/identidade-de-genero/. Acesso em: 04/04/2023.


SIGNIFICADOS. Tipos de pessoas não binárias: trans, agênero e outras identidades. Disponível em: https://www.significados.com.br/tipos-de-pessoas-nao-binarias/. Acesso em: 04/04/2023.


TARTUCE, Flávio. Transexualidade ou “Transexualismo”? A Construção da Cidadania Trans. Disponível em: https://flaviotartuce.jusbrasil.com.br/artigos/144342466/transexualidade-ou-transexualismo. 2015. Acesso em: 04/04/2023.




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