As Psicografias nos Tribunais

Rafaela Paes
No Direito, as provas têm como principal objetivo formar a convicção dos juízes acerca da efetiva existência, ou não, de fatos que solucionem um problema. Sendo assim, resumidamente, as provas buscam comprovar uma realidade.
O Código de Processo Civil Brasileiro utiliza como meios mais usuais de provas, os depoimentos das partes envolvidas, a exibição de documentos ou objetos pertinentes ao caso, as confissões, as testemunhas, as inspeções judiciais e as perícias. Entretanto, importante deixar claro que essas provas não estabelecem um limite, ou seja, de acordo com o artigo 369 do Código de Processo Civil, “as partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz”. Diante disso, tudo que for legal e em conformidade com a moral, pode ser admitido como prova em sede dos Tribunais.
Então, uma psicografia poderia ser aceita e utilizada como meio de prova? É o que nos mostram exemplos abaixo.
No ano de 1976, Henrique Emmanuel Gregoris foi morto por João Batista França, em uma brincadeira conhecida como roleta russa. Meses após o crime, o réu foi absolvido. Chico psicografou a carta, onde Henrique pediu que sua mãe perdoasse seu amigo. Sendo assim, Chico foi até a cidade onde a mãe residia e a entregou a carta. Ela, então, pediu a seu advogado que encerrasse o caso.
Ainda em 1976, Maurício Garcez Henrique estava na casa de seu amigo, José Divino Nunes, e ambos brincavam com a arma deste, que acreditavam estar sem munição. José acabou disparando contra o peito de Maurício, que morreu na hora. Sendo assim José Divino foi preso, alegando sempre inocência. Três meses após os fatos, os pais da vítima foram até Uberaba procurar Chico Xavier, mas não obtiveram qualquer comunicação do filho. Apenas no ano de 1978, Chico psicografou mensagem de Maurício, informando que ninguém tinha culpa pela sua morte. A carta foi entregue ao juiz e ele, diante de todas as provas, incluindo a carta, julgou o réu inocente. Houve uma longa batalha judicial, mas a decisão pela inocência foi mantida.
Mais tarde, no ano de 2006, Iara Marques Barcelos foi julgada inocente da acusação de ter mandado matar o seu amante Ercy da Silva Cardoso, morto na cidade de Viamão, com dois tiros na cabeça. A absolvição se deu com a entrega de uma carta psicografada pelo médium Jorge José Santa Maria, onde Ercy a isentou da culpa pelo crime.
Conforme visto nos três casos específicos, as psicografias foram preponderantes, de uma forma ou de outra, no resultado final de três acusações de homicídio. De acordo com o início do texto, podemos dizer que a psicografia foi considerada como uma prova documental, e está sujeita as mesmas regras pelas quais passa qualquer outra prova dessa natureza. Importante frisar que em casos de médiuns mecânicos e semi-mecânicos, a grafia e assinatura serão as do espírito, podendo ser comprovada por meio de perícia grafoscópica, o que já não ocorre com médiuns intuitivos, cuja psicografia não apresentará a grafia da entidade. Esta última, então, deverá apresentar conexão com as demais provas e particularidades da carta, averiguando-se a sua veracidade.
Tais detalhes acerca da psicografia são devidamente demonstrados no item 219 do Livro dos Médiuns: “Um fenômeno muito comum nos médiuns escreventes é a mudança de caligrafia segundo os Espíritos que se comunicam, e o que há de mais notável é que a mesma caligrafia se reproduz constantemente com o mesmo Espírito, e algumas vezes é idêntica com a que tinha em vida; veremos, mais tarde, as consequências que disso se podem tirar quanto à identidade. A mudança de caligrafia não ocorre senão com os médiuns mecânicos e semi-mecânicos, porque neles o movimento da mão é involuntário e dirigido pelo Espírito; não ocorre o mesmo com os médiuns puramente intuitivos, tendo em vista que, nesse caso, o Espírito atua unicamente sobre o pensamento, e a mão é dirigida pela vontade, como nas circunstâncias comuns; mas a uniformidade da caligrafia, mesmo nos médiuns mecânicos, não prova contra a faculdade, não sendo a mudança uma condição absoluta na manifestação dos Espíritos; ela se prende a uma aptidão especial da qual os médiuns, os mais mecânicos, não estão sempre dotados. Nós designamos os que têm essa aptidão, sob o nome de médiuns polígrafos”. Falemos, especificamente, de cada um deles.
No item 179 do Livro dos Médiuns, para fins deste artigo, destaca-se a última parte, onde os espíritos nos trazem, acerca dos médiuns mecânicos, que “o que caracteriza o fenômeno, nesta circunstância, é que o médium não tem a menor consciência do que escreve; a inconsciência absoluta, neste caso, constitui o que se chamam os médiuns passivos ou mecânicos. Esta faculdade é preciosa pelo fato de não poder deixar nenhuma dúvida sobre a independência do pensamento daquele que escreve”.
Em relação ao médium intuitivo, ele “atua como o faria um intérprete. Este, com efeito, para transmitir o pensamento, deve compreendê-lo, dele apropriar-se, de alguma sorte, para traduzi-lo fielmente e, portanto, esse pensamento não é o seu: não faz mais que atravessar o seu cérebro. Tal é exatamente o papel do médium intuitivo” (O Livro dos Médiuns, item 180).
No que tange os médiuns semi-mecânicos, o item 181 do Livro dos Médiuns esclarece que “no médium puramente mecânico, o movimento da mão é independente da vontade; no médium intuitivo, o movimento é voluntário e facultativo. O médium semi-mecânico participa dos dois gêneros; sente uma impulsão dada à sua mão, malgrado seu, mas, ao mesmo tempo, tem a consciência do que escreve, à medida que as palavras se formam. No primeiro, o pensamento segue o ato de escrever; no segundo, o precede; no terceiro, o acompanha. Estes últimos médiuns são os mais numerosos”.
Ocorre que os posicionamentos quanto ao uso da psicografia como meio de prova, são controversos. Embora alguns defendam a sua utilização, outros alegam que tal fato ofende o Estado Laico, colocando a psicografia como elemento religioso da Doutrina Espírita; já alguns alegam tratar-se de prova ilegal, e assim por diante, já que a intenção do artigo não é ser absolutamente técnico em termos jurídicos.
O que podemos concluir é que, diante da abertura do nosso Código de Processo Civil, no que tangem as provas, sim, a psicografia pode, como já o foi, admitida como prova documental, já que visa somente a busca pela justiça, em consonância com todo o conjunto probatório dos casos concretos. Além disso, acrescenta o Promotor de Justiça Thales Tácito de Pádua Cerqueira que “o certo é que se não há comunhão entre a fé religiosa e o conhecimento científico, não se pode, por isto, impedir que cartas psicografadas sejam juntadas nos autos, com o sofisma de que isto “seria retrocesso histórico”, comparando o AMOR do espiritismo com a Inquisição. Ninguém no espiritismo prega guerra, e sim AMOR. Assim sendo, podemos afirmar, até que se prove o contrário, pois o ônus da prova compete a quem acusa, sei disto, pois sou Promotor de Justiça, que as cartas psicografadas são prova lícita, que podem ser perfeitamente questionáveis por exame grafotécnico do falecido que psicografa e outros elementos de prova (testemunhas que conviveram com o mesmo, estilo de redação, família que ateste, etc.
Referências:
http://editoramagister.com/doutrina_24569037_ANALISE_SOBRE_A_PSICOGRAFIA_COMO_PROVA_JUDICIAL.aspx
http://www.limiarespirita.com.br/da_redacao/mauricio.html
http://www.limiarespirita.com.br/da_redacao/henrique.html
http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI97055,11049-TJRS+Mantida+a+absolvicao+de+acusada+que+apresentou+carta
https://anders23.jusbrasil.com.br/artigos/140984200/a-psicografia-como-meio-de-prova-judicial
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