Todas as Provas Enfrentadas são de Nossa Escolha?
Andresa Küster e Rodrigo Oliveira
O enfrentamento das provas que se apresentam durante a existência terrena oportuniza o aprendizado e evolução moral dos indivíduos. A Doutrina Espírita ensina que, enquanto as expiações são situações pelas quais a pessoa precisa passar para reparar erros de vidas passadas, as provas são oportunidades para progredir no percurso evolutivo. José Carlos Leal, na obra “A Moral Cristã e A Moral Espírita” explica que o conceito espírita de provas guarda semelhança com as avaliações escolares que são aplicadas para que os alunos avancem nas séries. Como exemplo, o autor afirma que nascer rico ou nascer pobre são provas com características distintas:
“Nascer rico ou nascer pobre implica duas perguntas. A primeira é: o que você vai fazer com seus bens materiais? A segunda é: como você vai fazer para progredir desprovido de bens materiais? Assim, esses dois tipos de circunstâncias não excluem nem incluem o espírito no caminho da evolução, mas lhe dão oportunidade para testar-se perante essas situações. (...) A fortuna e a pobreza, em si mesmas, nada significam. O que importa é o modo como o espírito passa por essas experiências.” (LEAL, 2020, p. 140).
No Capítulo V da obra “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, apresenta-se a distinção entre provas e expiações. Diante da necessidade de aprimoramento individual em determinado aspecto, existe a possibilidade de que o espírito escolha determinada prova ao reencarnar:
“Rendamos graças a Deus que, em sua bondade, concede ao homem o direito da reparação, e não o condena irrevogavelmente por uma primeira falta. No entanto, não se deve crer que todo sofrimento suportado aqui seja necessariamente o indício de uma determinada falta; muitas vezes são simples provas escolhidas pelo Espírito para acabar sua depuração e apressar seu adiantamento. Assim, a expiação sempre serve de prova, mas a prova nem sempre é uma expiação. Mas provas ou expiações são sempre sinais de uma relativa inferioridade, porque o que é perfeito não tem necessidade de ser provado. Um Espírito pode, pois, ter adquirido certo grau de elevação, mas, ainda querendo avançar, solicita uma missão, uma tarefa a cumprir, da qual, se sair vitorioso, será tanto melhor recompensado quanto mais penosa tiver sido a luta” (KARDEC, 2018a, p.64) .
O texto esclarece ainda que, no caso de pessoas possuidoras de tendências naturalmente boas, é possível que as provas solicitadas sejam superadas com resignação cristã, enquanto no caso das provas impostas como ferramentas de expiação de delitos pretéritos, é comum que provoquem reclamações e revolta contra Deus. Assim sendo, nem todas as provas são escolhidas pelo indivíduo ao reencarnar, mas todas são adequadas ao seu estágio evolutivo. Diante da impossibilidade de se identificar as origens das dificuldades que se apresentam, a resignação é apresentada como uma forma positiva de enfrentá-las. Além dos compromissos originados em existências pretéritas, durante a jornada terrena, novas provas podem se apresentar como resultado de decisões tomadas, sendo atribuição individual buscar compreender suas implicações e buscar superá-las de forma positiva. A resposta à questão 933 de “O Livro dos Espíritos” esclarece que a infelicidade dos encarnados pode ser majorada pela importância dada às questões materiais:
“Na maioria das vezes o homem só é infeliz pela importância que dá às coisas da Terra. A vaidade, a ambição e a cobiça, quando frustradas, fazem-no infeliz. Se se colocar acima do estreito círculo da vida material, se elevar seus pensamentos ao Infinito, que é o seu destino, as vicissitudes da humanidade vão parecer-lhe tão mesquinhas e pueris, como a tristeza da criança aflita com a perda de um brinquedo que representava sua felicidade suprema. Aquele que vê felicidade somente na satisfação do orgulho e dos apetites grosseiros é infeliz quando não pode satisfazê-los, ao passo que aquele que nada deseja de supérfluo sente-se feliz com o que outros consideram calamidades” (KARDEC, 2018b, p.300).
Na obra “O Código do Monte”, o autor Sérgio Luis da Silva Lopes, esclarece quanto ao papel da resignação durante a vivência de períodos difíceis que materializam as provas que podem contribuir para o crescimento espiritual:
“Jesus afirma que temos mais a aprender com as lágrimas do que com os risos. Algumas tristezas não devem ser evitadas ou desperdiçadas porque são fontes de crescimento, não pela dor em si mesma, mas pelo que ela pode proporcionar. O ensinamento aponta para uma virtude a ser desenvolvida, a resignação, a virtude que nasce do sofrimento. Por meio da resignação, o sofrimento é construtor de felicidade, e isso se passa em incontáveis situações da vida, desde a perda física de alguém querido ou de uma doença incurável na família. É a vida convidando-nos a desenvolver a resignação. Acontecimentos que não podem ser evitados e tantas outras situações que são irremediáveis precisam ser aceitas com o passar do tempo. Quem não sabe fazer isso sofrerá mais.” (LOPES, 2013, p. 50).
A resignação não se confunde com a passividade ou com a acomodação. O espiritismo ensina as situações vividas nas diversas encarnações, sejam elas positivas quanto as negativas, fazem parte da caminhada evolutiva do espírito. Ainda que não seja possível saber quais provas teriam sido escolhidas antes do retorno à terra, o autoconhecimento e a busca por aprimoramento constante podem ajudar a pessoa a compreender as oportunidades de aprendizado por elas representadas.
EFERÊNCIAS
KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Tradução de Matheus Rodrigues de Camargo, (com base na 11ª edição francesa, de 1869) 1ª ed. 42ª reimpressão. Capivari-SP: Editora EME, 2018a.
KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Tradução de Matheus Rodrigues de Camargo, 1ª ed. 22ª reimpressão. Capivari-SP: Editora EME, 2018b.
LEAL, José Carlos. A Moral Cristã e A Moral Espírita. 1ª reimp. Capivari-SP: Editora EME, 2020.
LOPES, Sérgio da Silva. O Código do Monte. 6ª ed. Porto Alegre/RS: Francisco Spinelli,2013.
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