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Processo de Desligamento no Momento da Morte


Rafaela Paes de Campos


A vida e a morte são os dois grandes movimentos da existência. O primeiro sempre vem acompanhado de imensa alegria por aqueles que esperam a chegada do novo ente e, o último, sempre carrega o fardo da tristeza pela separação. A vida não nos assusta, mas a morte, via de regra, sim, e muito se pensa a respeito da forma pela qual esse processo de partida se dá. Para isso, socorre-nos a sabedoria de O Livro dos Espíritos.


Primeiramente há que se mencionar que a separação da alma e do corpo se dá pelo rompimento dos laços que prendem uma à outra e, com isso, a alma então se desprende. Esse processo não se dá de forma abrupta, mas gradual, eis que “o Espírito se desprende pouco a pouco dos laços que o prendiam: eles se desatam, não se rompem” (KARDEC, 2018, p. 89).


Para os que estão iniciando os estudos nas sendas Espíritas, cabe informar o que traz Kardec em nota à questão 155.a:


Durante a vida, o Espírito está unido ao corpo por seu envoltório semimaterial ou perispírito. A morte é a destruição apenas do corpo, e não desse segundo envoltório, que se separa do corpo quando nele cessa a vida orgânica. A observação prova que, no instante da morte, o desprendimento do perispírito não se completa subitamente; opera-se gradualmente, com uma lentidão muito variável, conforme os indivíduos. Em alguns, é bem rápido, e pode-se dizer que o momento da morte é o mesmo da libertação, algumas horas depois. Mas em outros, sobretudo aqueles cuja vida toda foi exageradamente material e sensual, o desprendimento é muito mais lento e algumas vezes pode durar dias, semanas e até meses, o que não implica que haja nos corpos a menor vitalidade, nem a possibilidade de um retorno à vida, mas uma simples afinidade entre o Espírito e o corpo, que se deve sempre à importância que o Espírito deu à matéria durante a vida. De fato, é racional conceber que quanto mais o Espírito estiver identificado com a matéria, mais ele sofrerá para separar-se dela, ao passo que a atividade intelectual e moral, a elevação dos pensamentos, operam um início de desprendimento, mesmo durante a vida do corpo, e quando chega a morte, o desprendimento é quase instantâneo. Este é o resultado de estudos feitos sobre todos os indivíduos observados no momento da morte. Essas observações provam ainda que a afinidade que em certos indivíduos persiste entre a alma e o corpo é, às vezes, muito penosa, pois o Espírito pode experimentar o horror da decomposição. Esse caso é excepcional e peculiar a certos gêneros de vida e a certos gêneros de mortes; mostra-se em alguns casos de suicidas. (KARDEC, 2018, p. 89).


Uma informação bastante importante é trazida neste trecho, eis que a velocidade do desprendimento da alma e do corpo será ditada pela forma com que a alma viveu na materialidade. Sabemos o quanto é importante que entendamos que os bens materiais são empréstimos transitórios para a vida terrena, ou seja, não os levaremos. É no aperfeiçoamento moral que mora a riqueza que nos permitirão levar no retorno à vida Espírita e, por isso, quanto mais nos apegamos à matéria, mais lento será o processo de desprendimento, eis que o Espírito dá demasiada importância aquilo que, pelas leis que regem a vida, é perecível.


Seguindo, esse desprendimento não é doloroso, pois a alma nada sente e pode até sentir certo prazer, uma vez que é o momento da libertação da prisão na qual se configura o corpo material (KARDEC, 2018, p. 88).


Outro questionamento importante está contido na questão 156 de O Livro dos Espíritos:


156. A separação definitiva da alma e do corpo pode ocorrer antes que a vida orgânica cesse completamente?


Na agonia, a alma às vezes já deixou o corpo: há somente a vida orgânica. O homem não tem mais consciência de si mesmo e, no entanto, ainda lhe resta um sopro de vida. O corpo é uma máquina movida pelo coração; existe enquanto ao coração fizer circular o sangue nas veias, e não necessita da alma para isso. (KARDEC, 2018, p. 89).


O que se leciona é que, quando o corpo se encontra em agonia, por vezes o Espírito já o abandonou, restando apenas a vida orgânica da qual não depende a presença da alma. Um breve parêntese para explicar que, na época da escrita de O Livro dos Espíritos, a morte era considerada com a cessação da atividade do coração, mas já sabemos que hoje a ciência considera a morte encefálica como aquela que dita o fim da vida orgânica.


Adiante, aprendemos que a alma, ao sentir romperem-se os laços que a prende ao corpo, esforça-se para rompê-los de forma total e, já parcialmente desprendida, consegue visualizar, em parte, o estado de Espírito no qual adentrará. Quando se vê no mundo dos Espíritos, finalmente, experimentará sensação condizente com a vida que levou na matéria, sentindo vergonha caso tenha feito o mal com o desejo de assim fazer ou sentirá alívio do peso da matéria, tendo sido justa durante a sua vida. (KARDEC, 2018, p. 90).


Por fim, cabe mencionar que, com o desprendimento, o Espírito reencontrará aqueles por quem possui afeição, pois estes, via de regra, vêm recebê-lo em seu retorno ao mundo Espírita e o auxiliam no desligamento da alma e do corpo (KARDEC, 2018, p. 90).

Diante de todo o exposto, portanto, compreende-se que o processo de desligamento da alma e do corpo se dá de forma gradual, sem que haja dor física. Entretanto, este processo guardará semelhanças com a vida vivida pelo Espírito e sua velocidade será ditada pelo apego ou não à matéria.


Por isso, que nos lembremos sempre de que o que é importante para o Espírito não é o que a vida material nos faz perseguir, mas sim aquilo que aprendemos ao longo dos caminhos, as lições ultrapassadas, os resgates bem-sucedidos e a moralidade desenvolvida, de forma a elevar o Espírito nas escalas espirituais.


REFERÊNCIAS

KARDEC. Allan. O Livro dos Espíritos. Tradução de Matheus Rodrigues de Camargo. 23ª reimp. Capivari: Editora EME, 2018.

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