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Espiritismo e o envelhecimento: Ensinamentos espirituais sobre a terceira idade

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Jeferson Quadros


O passar dos séculos tem trazido novas realidades e perspectivas à Humanidade. O ambiente, o modo de vida, as ciências, as tecnologias, enfim, tudo evolui a olhos vistos! As mudanças promoveram, e ainda promovem, benefícios em todos os setores da vida humana. As consequências dos avanços levam à melhoria nas condições de vida da população em geral e também ao aprimoramento das técnicas e práticas das ciências da saúde, bem como dos seus recursos. Como resultado, temos o aumento progressivo da perspectiva de vida das pessoas. No Brasil, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE, em 1940 a média de vida era de 45,5 anos e em 2022 a média passou para 75,5 anos (BRASIL, 2023). Além da ampliação da média de idade, as análises demográficas demonstram que a população brasileira está envelhecendo. Esse envelhecimento é decorrente de dois fatores: a ampliação da idade média das pessoas e a diminuição do número de componentes das famílias. Segundo o documento Fatos e Números: Famílias e filhos no Brasil, do Observatório Nacional da Família, a taxa de fecundidade no Brasil diminuiu de 6,28 filhos em 1960 para 1,87 filhos em 2010 e as projeções apontam que em 2030 a taxa diminua para 1,5 filhos (BRASIL, 2021).

 

O envelhecimento das populações é uma realidade que ocorre em diversos países, tornando-se uma das preocupações da OMS, a Organização Mundial da Saúde. Inúmeras ações são realizadas para dar suporte às comunidades de todo o planeta. Um exemplo dessas ações organizadas pela OMS é a década do envelhecimento saudável nas Américas, que ocorre desde 2021 e vai até 2030. Segundo a OMS:

 

A população mundial está envelhecendo mais rapidamente do que no passado, mas na América Latina e no Caribe essa transição demográfica está ocorrendo de forma ainda mais acelerada. Mais de 8% da população tinha 65 anos ou mais em 2020 e estima-se que essa porcentagem dobre até 2050 e exceda 30% até o final do século (OMS, 2020).

 

Em suma, os cenários projetados apontam que o envelhecimento é uma tendência cada vez mais consolidada, sendo indispensável preparar as pessoas para encarar e vivenciar a senilidade.

 

Demonstrando a atemporalidade de seus conceitos, a Doutrina Espírita nos instrui e prepara para essa fase tão desafiadora da vida, mesmo tendo sido codificada num período em que a perspectiva de vida era muito inferior à que temos hoje.

 

Inicialmente os Bons Espíritos nos instruem sobre as responsabilidades dos “mais novos” em relação às pessoas idosas, visto que o avanço da idade traz uma série de dificuldades que precisam ser supridas pelo apoio de terceiros. Em O Evangelho Segundo o Espiritismo, no texto sobre a piedade filial, encontramos que:

 

Honrar a seu pai e a sua mãe não consiste apenas em respeitá-los; é também assisti-los na necessidade; é proporcionar-lhes repouso na velhice; é cercá-los de cuidados como eles fizeram conosco na infância (KARDEC, 2023 p. 179).

 

E em O Livro dos Espíritos, em resposta à questão 685, na qual Allan Kardec indagou se o homem tem o direito de repouso na velhice, os Espíritos respondem “sim, que a nada é obrigado, senão de acordo com as suas forças” (KARDEC, 2022, p. 259); e na questão 685a, onde o Codificador questionou o que há de fazer o velho que precisa trabalhar para viver e não pode, obteve como resposta que “o forte deve trabalhar para o fraco. Não tendo este família, a sociedade deve fazer as vezes desta. É a lei de caridade.” (KARDEC, 2022, p.259)5

 

Temos, nas citações acima, a orientação sobre a responsabilidade que devemos assumir nas esferas individual e coletiva, para com as pessoas que já atingiram a senectude, sejam elas familiares ou não, provendo às pessoas idosas todo o necessário para que tenham dignidade e qualidade de vida, tal qual prescreve a Lei de Caridade.

 

Torna-se imprescindível envidar esforços em prover o amparo aos “nossos idosos”, cientes de que essa, nem sempre, será uma tarefa fácil. A senilidade impõe gradativas mudanças e limitações que, nem sempre, são entendidas e aceitas, tanto no que se refere à pessoa idosa quanto aos familiares. Em situações assim, é preciso muita empatia e paciência. As dificuldades podem decorrer também de doenças características da terceira idade, onde além da boa vontade e do amor, será preciso recorrer ao auxílio de profissionais que possam ampliar os cuidados indispensáveis.

 

Seguindo agora por uma perspectiva individual, com olhares voltados ao futuro, precisamos nos preparar para a chegada da velhice, lembrando que a aceitação da realidade futura é indispensável para aproveitar melhor o que esse período tão importante tem a oferecer. O envelhecimento é uma lei natural, um processo que ocorre da mesma forma para todos, contudo é importante levar em conta que o “envelhecer” é uma ocorrência peculiar a cada indivíduo. Por isso, não há como prescrever uma “receita de bolo” para preparar a chegada da terceira idade, pois cada pessoa experimenta o processo de envelhecimento e reage a ele de forma diferente. O que ninguém questiona é que essa preparação é um trabalho íntimo, de responsabilidade de cada pessoa. Sobre isso, o Dr. Carlos Durgante afirma que:

 

Não devemos deixar para nos preocuparmos apenas quando o inevitável chegar, pois para que qualquer projeto seja bem-sucedido, é imprescindível que iniciemos sua preparação muito antes de ele acontecer” (DURGANTE, 2016, p. 26).

 

Deixando claro que os indivíduos devem se preocupar com o preparo para a chegada da terceira idade, trabalhando aspectos físicos, buscando fortalecer a saúde e ampliar a qualidade de vida, mas também aspectos psicológicos e espirituais, que ajudarão a lidar melhor com os desafios que se apresentarão. O Espírito Emmanuel faz importante reflexão a respeito do preparo para a chegada da velhice, dizendo que:

 

Cada homem possui, com a existência, uma série de estações e uma relação de dias, estruturada em precioso cálculo de probabilidades. Razoável se torna que o trabalhador aproveite a primavera da mocidade, o verão das forças físicas e o outono da reflexão, para a grande viagem do inferior para o superior; entretanto, a maioria aguarda o inverno da velhice ou do sofrimento irremediável da Terra, quando o ensejo de trabalho está findo (EMMANUEL, 2016, p. 521).

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Tal citação está em referência aos esforços que devemos empreender ao longo da existência física, principalmente nas épocas de plenos vigor físico e disposição, para dar início à preparação física, moral e espiritual para o futuro.

 

Com vistas aos preparativos íntimos que devemos executar, Léon Denis, na obra O Problema do ser, do Destino e da Dor, faz a seguinte reflexão sobre o cenário que nos espera:

 

À medida que avançamos na vida, as alegrias diminuem e as dores aumentam; o corpo e os fardos da vida tornam-se mais pesados. Quase sempre a existência começa na felicidade e finda na tristeza. O declínio traz, para a maior parte dos homens, o período moroso da velhice com suas lassidões, enfermidades e abandonos. As luzes apagam-se; as simpatias e as consolações retiram-se; os sonhos e as esperanças desvanecem-se; abrem-se, cada vez mais numerosas, as covas em roda de nós. É então que vem as longas horas de imobilidade, inação, sofrimento; obrigam-nos a refletir, a passar muitas vezes em revista os atos e as lembranças de nossa vida. É uma prova necessária para que a alma, antes de deixar seu invólucro, adquira a madureza, o critério e a clarividência das coisas que serão o remate de sua carreira terrestre. Por isso, quando amaldiçoamos as horas aparentemente estéreis e desoladas da velhice enferma, solitária, desconhecemos um dos maiores benefícios que a natureza nos proporciona: esquecemos que a velhice dolorosa é o cadinho onde se completam as purificações (DENIS, 2016, p. 355).

 

As palavras de Léon Denis trazem um resumo dos desafios que o envelhecimento acarreta, com os quais não é nada fácil lidar, como bem sabemos. Porém, apesar das dificuldades, a etapa final da vida, a velhice, é um período de reflexões, de amadurecimento moral, decorrente das fartas experiências que as décadas de lutas e desafios, de alegrias e tristezas, de suor e lágrimas, permitem adquirir. A Sabedoria Divina, atenta ao processo de evolução ao qual todos estamos sujeitos, permite que muitos de nós venhamos sofrer as injunções que o período da velhice impõe, pois os benefícios ao Espírito Imortal são de valor inestimável.

 

A maturidade que caracteriza a senectude permite “ver a vida” com olhar mais amplo do que nos períodos anteriores, permite refletir sobre escolhas do passado, sobre os erros, os acertos, permite que, em viagens muito proveitosas ao imo do ser, abram-se portas que levam à transformação moral, à evolução. Léon Denis reflete sobre isso, dizendo-nos que:

 

Nesse momento da existência, os raios e as forças que, durante os anos da juventude e da virilidade, dispersávamos para todos os lados em nossa atividade e exuberância, concentram-se, convergem para as profundezas do ser, ativando a consciência e proporcionando ao homem mais sabedoria e juízo. Pouco a pouco vai-se fazendo a harmonia entre os nossos pensamentos e as radiações externas; a melodia íntima afina com a melodia divina (...) Há, então, na velhice resignada, mais grandeza e mais serena beleza que no brilho da mocidade e no vigor da idade madura. Sob a ação do tempo, o que há de profundo, de imutável em nós, desprende-se e a fronte dos velhos aureola-se de claridades do Além (DENIS, 2016, p. 355 e 356).

 

Em resumo, a velhice pode nos ajudar a nos tornarmos pessoas melhores pelas transformações que ela provoca. O tempo, que no passado era o inimigo que fazia a vida transcorrer muito rápido, torna-se o amigo vagaroso, paciente, que, ao desacelerar o compasso das horas, permite que haja tempo para si mesmo, criando campo fértil para o cultivo de pensamentos e sentimentos até então relegados a segundo plano, quando não completamente esquecidos.


O Espiritismo, enfim, nos auxilia a nos prepararmos e também para suportarmos o importante período da velhice. Somos orientados sobre as dificuldades, desafios e sofrimentos que poderão nos envolver, mas também é-nos clarificada a necessidade desses momentos em nossa jornada no plano físico, que também repercute na existência espiritual. A Doutrina Espírita nos fortalece moralmente para que vejamos não só as dificuldades, mas sim a magnífica oportunidade de burilarmos nosso íntimo, sublimando sentimentos, controlando instintos, num preparo essencial para o retorno à Pátria Espiritual, que nos aguarda a todos.


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Referências:

1- BRASIL, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Em 2022, expectativa de vida era de 75,5 anos. Disponível em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/38455. Pesquisado em 01/10/2024.

2- BRASIL, Ministério da mulher, da família e dos direitos humanos. Fatos e números: Famílias e filhos no Brasil. Brasília - DF, 2021 Disponível em: https://www.gov.br/mdh/pt-br/navegue-por-temas/observatorio-nacional-da-familia/fatos-e-numeros/familias-e-filhos-no-brasil.pdf. Pesquisado em 01/10/2024.

3- OMS - ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Década do envelhecimento saudável nas américas 2021-2030. Disponível em: https://www.paho.org/pt/decada-do-envelhecimento-saudavel-nas-americas-2021-2030. Acesso em 01/10/2024.

4- KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo, tradução de Guillon Ribeiro. 1ª edição. Campo dos Goytacazes-RJ: Editora Letra Espírita, 2023.

5- KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos, tradução de Guillon Ribeiro. 1ª edição. Campo dos Goytacazes-RJ: Editora Letra Espírita, 2022.

6- DURGANTE, Carlos Eduardo Accioly. Planejando o Futuro. 1ª edição. Porto Alegre-RS: Editora Francisco Spinelli, 2016.

7- EMANNUEL (Espírito). O Evangelho por Emmanuel: comentários ao Evangelho segundo Mateus. organizado por Saulo Cesar Ribeiro da Silva. 1ª ed, 5ª reimpressão. Brasília: FEB Editora, 2016.

8-DENIS, Léon. O problema do ser, do destino e da dor. 32ª ed, 7ª impressão. Brasilia: FEB editora, 2016.

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